Luiza Müller, 2º semestre de Jornalismo
Com um grande pôster do Masterchef exposto na fachada e um lance de escadas pela frente, trilhei o caminho da primeira visita que faria a uma redação. Meio ao pano de fundo do noticiário da Band, tão antigo na memória, entrei no ambiente com certa cautela e o completo desejo de ser aceita, se não pela equipe, pelo próprio jornalismo. Avistei o jornalista Fábio Pannunzio, no que ele depois me informaria ser o espaço de idealização do jornal da noite. Sentamo-nos e aguardamos a conclusão da entrevista da presidenciável Marina Silva para o Jornal Nacional. Após o término, acompanhei Pannunzio à sala de reuniões, onde ficaríamos pelos próximos 40 minutos discutindo um propósito comum: o jornalismo.
Com quase quatro décadas de experiência e uma variedade de reportagens bem-sucedidas, Pannunzio admite a efemeridade das alegrias do jornalismo, constatando que sua duração corresponde às 24 horas do dia, quando a busca por novas reportagens deve se reiniciar. Porém, movido pela eterna bobina da busca pela realidade dos fatos, acredita na graça e nas dores de poder acordar para um novo mundo todos os dias, acrescentando que “a grande compensação [da profissão] é cumprir direito suas missões, fazer uma bela matéria e descobrir algo que estava muito escondido”. Ainda sobre a rotina acelerada do jornalista, Pannunzio afirma que “idealizamos o furo, mas vivemos de dar a notícia que todos estão dando”, pontuando a crucialidade da constância na execução do jornalismo diário, que, por ser mais rápido, por vezes se torna menos caprichoso.

Diante da grande janela de vidro da sala de reuniões, segui para a pergunta chave: que característica deve ter o aspirante à jornalista investigativo? Iniciando a resposta com um “Bom, vamos lá”, Pannunzio desbanca o complemento de jornalista “investigativo”, afirmando que todo profissional da área deveria “em primeiro lugar, ter curiosidade, estar constantemente atrás de suas respostas; em segundo, ter ceticismo, estar desconfiado de tudo que te apresentam e em terceiro, que é elementar e estrutural, ter cultura geral e leitura”. Com a receita na ponta da língua, complementou seu terceiro ponto, afirmando que o jornalista que não tem instrumentos, como vocabulário e estilo, não consegue descrever o mundo que ele observa, por mais que seja bom em sua área. Continuando sua linha de ideias, bem ponderadas e fluídas, demonstrou contrariedade com a comum falta de curiosidade nas redações, creditando a decadência do jornalismo à tal insuficiência, que as transforma, assim, em “chão de fábrica, sendo as notícias, salsichas, que tem o mesmo sabor, informação barata”.
Autor do livro-reportagem A Última Trincheira, sobre as forças armadas revolucionárias colombianas, Pannunzio compreende bem a necessidade da apuração presencial, defendendo que a emoção sentida durante a apuração se materializa no material final, assim perfazendo o caminho natural que a matéria deve tomar. Além disso, se auto-intitulando um dinossauro da profissão, Pannunzio afirma que jornalismo se faz na rua, como aprendeu no princípio de sua formação, sendo que o jornalista que vive de garimpar informações de dentro da redação terá sempre uma visão desfocada de mundo. Tecendo o cenário do passado da área com o que hoje se apresenta com todos os recursos tecnológicos disponíveis para pesquisa e edição, Pannunzio me mostra uma nova possibilidade de fazer jornalismo, que apesar de integrar tecnologia com apuração, não deve se distanciar da sua base fundadora e crucial: jornalismo se faz na rua.
No mais, Pannunzio comenta que, para se manter íntegro, o jornalista deve “se despir de suas paixões pessoais”, assim fazendo jus aos valores humanistas e republicanos, cobrados pela ética jornalística. Citando o ilustre jornalista Millôr Fernandes, ressalta: “Jornalismo é oposição; o resto é armazém de secos e molhados”. Longe de fazer parte de tal grupo bajulador, Pannunzio se orgulha de sua atuação plural e abrangente, comentando que basta pesquisar seu nome para notar críticas formuladas de lados ideológicos opostos, comprovando assim, sua busca pelo que é questionável e não somente por seus afetos.
Como forma de quitar uma curiosidade egoísta, nessa hora pergunto como ele sabe que está perto de uma pauta importante. E a resposta vem com objetividade sincera: “quando chego em casa e não consigo dormir”. Provenientes dessa insônia, Pannunzio produziu matérias excelentes, ganhando dois prêmios Esso pelas séries de reportagem “Desaparecidos” (2012), e o “Avanço da Maconha” (2014). Comentando sobre tal experiência, Pannunzio admite que só se sentiu verdadeiramente validado em sua segunda vitória, considerando a possibilidade de sorte ao ganhar o primeiro.
Para finalizar a entrevista, perguntei que conselho daria a um estudante de jornalismo que está dando os primeiros passos na profissão. “Persistência”, disse Pannunzio. E aqui permanecemos, sapatos de solas gastas e perspectivas honestas, alegrias efêmeras e paixões dissipadas, longes, mas bem longes, do armazém de secos e molhados.
